Capítulo 7 - Contacto
O sonho era recorrente: uma mulher roliça já de uma certa idade dizia com um ar muito sério por entre os seus caracóis loiros oxigenados:- Ela é sogra da minha filha, mas eu venho aqui com ela porque a gente até ter a terra sobre os nossos olhinhos não sabe ao que chega!
Acordava invariavelmente estremunhado e perplexo quando tinha este sonho. A mulher estava sentada numa cadeira que parecia ser de uma sala de espera e falava muito compenetradamente com ele... Mas ele não se lembrava nunca de ter visto aquela mulher senão naqueles sonhos bizarros.
-Irra! Qualquer dia, juro que vou ao psicólogo saber porque raio é que eu sonho com uma gorda loira! Ainda se fosse uma gaja boa...
Estava a fazer-se tarde, e à medida que o tempo passava, crescia a irritação de David. Achava aquela situação ridícula além do aceitável. Nunca, em tantos anos de detective se vira numa alhada semelhante.
Levantou-se para sair da Estação e foi quando pedia um táxi que se deparou com o seu contacto, escondido por detrás de um grande jornal, como se se tratasse de um qualquer espião hollywoodesco.
Dirigiu-se a ela sem rodeios, num gesto de clara retaliação, sabendo o quão desconcertada ficaria. O assunto de que tratava era delicado, tal como as notícias que obtivera, pelo que a sua consciência profissional não lhe permitia divulgar imediatamente o resultado da sua investigação, mas pegou-lhe pelo braço com brusquidão e arrastou-a para o táxi mais próximo.
Sem grandes cerimónias pregou-lhe um sermão agastado sobre ética contratual e de como aquela não era forma de se tratar fosse quem fosse.
Os seus olhinhos quase negros olhavam-no como se não tivesse mais de doze anos e houvesse inocentemente cometido uma tropelia idiota.
“Que criatura deliciosa!” pensou para si mesmo, enquanto lhe dizia de novo as horas que havia aguardado sem notícias suas na estação.
O “contacto” era na realidade uma mulher intrigante. Cabelos encaracolados e negros, olhos da mesma cor, corpo fino e cara de menina. Dizia que nunca tinha contratado um detective privado antes e que se tinha comportado conforme o que achava que seria correcto enquanto pedia desculpas atabalhoadamente. Era inacreditavelmente nervosa e verborreica. Não se calara um momento desde que entraram-no táxi e David terminou o discurso, e embora fosse ligeiramente irritante, era impossível ficar aborrecido com ela, dada a sua fragilidade patente e a forma como se dava humildemente como culpada.
“Tudo bem. Uma vez que já perdi o meu avião, não há necessidade para pressas. Vamos ao meu escritório para eu lhe explicar tudo direitinho e lhe entregar as papeladas em condições.”
“Eu cubro todos os seus prejuízos...”
David sorriu como quem ouve uma coisa óbvia.
Pararam em frente a um edifício azul com bom aspecto. David deu prioridade à senhora e pagou o táxi. Acima de tudo era um cavalheiro.
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Dava voltas tentando justificar o injustificável:
"Surgiram outras prioridades, tive de fazer outras coisas..."
Um certo ar de tristeza e desilusão assomou no seu rosto.
"So sorry..."
1 Comments:
é claro que achei deliciosa a imagem da senhora da sala de espera...
Acho que o enredo se a compor... ainda vão conseguir compor uma teia engraçada!
Não se esqueçam de fazer + interlúdios.
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